“A mãe de Sísera
olhava pela janela, e exclamava pela grade: Por que tarda em vir o seu carro?
Por que se demoram os ruídos dos seus carros? As mais sábias das suas damas
responderam; e até ela respondia a si mesma: - Porventura não achariam e
repartiriam despojos? Uma ou duas moças a cada homem? Para Sísera despojos de
estofos coloridos, despojos de estofos coloridos bordados; de estofos coloridos
bordados de ambos os lados como despojo para os pescoços.” (Juízes 5:28-30)
Morre Eúde, um grande homem de Deus,
juiz valoroso erguido em um tempo em que o povo de Israel clamava por ter
vivido em grande sofrimento, por dezoito anos oprimidos por Eglom, rei dos
moabitas. Eúde fora o libertador canhoto que, escondendo sua espada em sua coxa
direita, sob a desculpa de presentear Eglom, propõe-lhe uma audiência secreta.
Estando a sós com o rei trouxe-lhe uma palavra do Senhor na forma da espada
que, desembainhando-a com sua mão esquerda, o atravessaria tão profundamente
que até o cabo daquela arma lhe penetraria as entranhas gordas, derramando
sangue, banha e excremento.
Após a morte de tão estimado e
corajoso juiz, o povo de Israel torna a fazer o que é mau diante do Senhor,
pelo que, em sua soberania, os vende a Jabim, rei de Canaã, que tinha Sísera
por seu capitão. Sísera, por sua vez, estava tranquilo, confiado na mais alta
tecnologia de sua época, equipado com as mais poderosas armas de guerra, a
saber: novecentos carros de ferro. Esse poderio bélico lhe permitiu a opressão
do povo de Deus por vinte anos de modo violento.
É nesse contexto que, de modo
inusitado e até irônico, conforme tantas vezes se reflete a Providência divina,
surge Débora, uma juíza. Aqui, eu gostaria de relatar o contraste: toda a força
bélica e a tecnologia de ponta de um exército que fazia os homens de Israel
tremer e se desesperar agora colocadas diante de uma mulher, profetiza, que em
toda a sua vulnerabilidade feminina, revelou uma força interior ímpar, uma fé
inabalável que superava a força de todos os homens de Israel de seu tempo.
Parece que mais uma vez as palavras de Paulo fazem todo o sentido “a fraqueza
de Deus é mais forte que os homens” (I Coríntios 1:25). No meio de uma geração
de homens frouxos e incapazes de confiar na ordem do Senhor, uma mulher é
erguida para levá-los ao inescapável combate e, consequentemente, à inevitável
vitória.
Antes, porém, é preciso mais uma vez
contextualizar: já havia uma ordem direta dada pelo Senhor por meio de seus
oráculos. Uma ordem, uma promessa e uma profecia: três em um. Em suma, Deus
havia mandado Baraque reunir dez mil homens, dos filhos de Naftali, para
pelejarem contra Sísera, com todos os seus poderosos carros e exército, visto
que Ele lhes entregaria em sua mão. Baraque, frouxo e incrédulo ou incrédulo e
frouxo – realmente não sei o que vem primeiro: a incredulidade e após a
frouxidão ou a frouxidão seguida de incredulidade -, diz que só iria à guerra
se Débora o acompanhasse. O certo é que
tanto a incredulidade quanto a covardia parecem ser sócias do empreendimento
que culmina na falência da masculinidade. As duas características em um
homem são a receita certa para o fracasso
e para emasculação.
A posição firme, a certeza, a fé e a
coragem, porém, estão presentes em Débora: - É claro que irei contigo, porém
não será tua a honra da jornada que empreenderes, pois à mão de uma mulher o
Senhor venderá a Sísera (Juízes 4:9). Essa atitude de Débora me remete
inevitavelmente aos nossos dias, onde homens valorosos estão cada vez mais
escassos. A título de exemplo, relembro-me das cenas do trágico acidente com o
jornalista Ricardo Boechat onde, enquanto vários homens filmavam a quadro terrível
do helicóptero em chamas e um caminhão incendiando, foi uma mulher que tentava
com todas as suas forças salvar o motorista do caminhão. Aqueles celulares, nas
mãos daqueles covardes, apáticos à dor, fizeram-se testemunhas da qualidade de
homens que nossa geração formou.
Não poucas vezes, ao ver alguma cena
de assalto, os homens correm desesperadamente deixando suas esposas, namoradas,
noivas, irmãs nas mãos dos malfeitores. Em pegadinhas criadas para nos divertir
um pouco, inúmeras vezes homens usam mulheres como escudo humano. Os próprios
“corajosos” bandidos que andam armados e com pompas de “poderosos chefões”,
choram como crianças pedindo pela mamãe quando, pegos pela polícia, são
alvejados. Em tempos de homens frouxos, Deus entrega a honra a mulheres. Em
dias de emasculados, mulheres são erguidas para o exercício ministerial que
caberia, primordialmente, a nós homens. Diante da nossa omissão, covardia e
incredulidade, muitas mulheres serão postas em lugar de honra e, por incrível
que venha a parecer, para a nossa desonra.
“Baraques” desonram o nome de Deus com
sua covardia; blasfemam Seu precioso nome com sua incredulidade; infamam o Seu
nome com sua inatividade. Servir ao Senhor requer coragem, fé, confiança e
ação. Um verdadeiro homem de Deus não se lançará à passividade. Há um pulsar
que lhe move; as virtudes lhe compelem ao bem; o medo não lhe é um obstáculo; a
força do inimigo não lhe ameaça. Ele conhece o Deus que confia e desse Deus é
conhecido.
Contudo, tornemos ao cenário: Débora sobe
ao monte Tabor com Baraque e outros dez mil homens; enquanto isso, junto ao
ribeiro de Quisom, Sísera se arma com seus novecentos carros fortes, os
aparatos tecnológicos mais avançados de seu tempo, e com todo o povo que estava
com ele. Então a ordem é dada por aquela mulher valorosa: - Levanta-te,
Baraque, pois o Senhor tem dado a Sísera na tua mão. Baraque desce e, com seus
dez mil homens, derrota todo o exército de Sísera junto com todos os seus
carros, não deixando um sequer vivo. E aqui começa a outra parte da história:
Sísera abandona seu exército à morte, provavelmente estupefato com o fato de o
exército de Israel não ter temido a peleja, apesar de toda a força que tinha em
seus carros e exército. Foge a pé e desesperado até a tenda de Jael, esposa de
Héber. Ali ele acredita estar seguro, visto que havia um acordo de paz entre o
seu rei e a casa de Héber.
Vejamos agora o seguinte: Sísera
deposita toda a sua confiança em seus carros de ferro e em seu exército. Para
que você se situe: os exércitos de Israel ainda viviam a era do bronze, de
sorte que suas espadas e armas eram muito mais frágeis e se partiam diante da
força e violência das armas de ferro. Essa era a superioridade tecnológica do
exército capitaneado por Sísera. Por esse motivo é que ele acreditava que o
exército liderado por Baraque sequer desceria à guerra. A presença de sua força
bélica e de seu exército seria suficiente para derrubar o moral do exército de
Israel, conforme acreditava e conforme já vinha sendo aplicado e confirmado por
anos. Vemos claramente, que um homem covarde deposita toda a sua esperança na
força de outros homens e em aparatos que julga serem superiores e, ao mesmo
tempo, deposita sua confiança no que é previsível, não fazendo planos e nem se
preparando para a imprevisibilidade. O que era, naquele caso, previsível? O
fato da força de seu exército subjugar todos os outros pelo medo e pelo receio.
Já um homem de Deus confia a sua força no Senhor, contra toda a lógica
tecnológica que se ergue diante dele. O homem de Deus nem sequer à morte teme, visto que sua vida jaz com Seu Senhor no
madeiro (Gálatas 2:20) e sua morte
vem resguardada pela certeza da Ressurreição.
Dando continuidade, o relato bíblico
nos informa que Sísera chega à tenda de Héber, onde encontra sua esposa Jael,
totalmente desesperado, como um garotinho tremendo de pavor. E ali nós temos a
figura de uma mulher que guarda
inteligência emocional para lidar com uma situação de completo risco contra
si mesma e contra a sua casa. Mas não só inteligência emocional para aquele
momento: implicitamente, Jael demonstra mais fé no Deus de Israel ou pelo menos
no exército de Israel, do que os homens de Israel. Note que a escritura nos
afirma que Jael se antecipa e sai ao encontro de Sísera. Essa antecipação
estratégica de Jael geraria confiança por parte de Sísera, com relação à
possibilidade de achar abrigo seguro enquanto lhe daria tempo para arquitetar a
sua morte. Notem bem que Jael revelava muito mais coragem que a maioria dos
homens e ao mesmo tempo muito mais controle. Provavelmente, sob o iminente
risco de se ter um fugitivo em sua casa, provavelmente um homem o impediria de
entrar. Jael não: vai ao seu encontro, oferece-lhe abrigo e se prepara para
aniquilá-lo.
Voltamos agora para Sísera: ele foge
igual a um garotinho medroso, abandonando a batalha e deixando os seus homens à
sina da morte. Em sua fuga, ao invés de erguer-se em coragem para buscar a sua
proteção, prefere ser abrigado e guardado por uma mulher. Não poderia ser mais
irônico o fato de o frouxo ser alimentado com leite, quando pediu água, acompanhado
de um cobertor para lhe esconder. Esses detalhes quase que esculpem ao caráter
de Sísera o que foi se firmando como óbvio: não se tratava de um homem, mas de
um “bebezão”; e como tal, nada melhor que leitinho, para que o filhinho da
mamãe possa dormir e uma cobertinha para ficar bem quentinho. Jael, então, após
vê-lo adormecer, pega uma estaca e um martelo e lhe atravessa o crânio de
orelha a orelha até fincar ao solo. Ao chegar ao local, atrasado como sempre,
tal qual se espera de um homem que não é proativo e seguro, Baraque é recebido
por Jael, que é honrada em seu lugar pela morte do capitão do exército de
Jabim, rei de Canaã.
Assim, no capítulo cinco de Juízes
vamos ouvir ao cântico e a poesia composta por Débora, que transcreve em seus
versos o texto que abre a essa presente reflexão:
“A mãe de Sísera
olhava pela janela, e exclamava pela grade: Por que tarda em vir o seu carro?
Por que se demoram os ruídos dos seus carros? As mais sábias das suas damas
responderam; e até ela respondia a si mesma: - Porventura não achariam e
repartiriam despojos? Uma ou duas moças a cada homem? Para Sísera despojos de
estofos coloridos, despojos de estofos coloridos bordados; de estofos coloridos
bordados de ambos os lados como despojo para os pescoços.” (Juízes 5:28-30)
Nesse breve relato temos uma mãe que
cria na vitória de seu filho, tão cheio de pompas e confiante, já imaginando os
espólios que traria da guerra, as donzelas que subjugaria e o barulho da glória
invicta que seus carros tocariam. Para aquela mãe, a certeza de êxito naquela
batalha a convertia quase que em um mero retorno de uma visita ao Shopping
Center, com as sacolas cheias de tesouros e roupas; tecidos bordados e tudo que
enaltece aos olhos. Não sabia que o ornamento que enfeitaria a cabeça de seu
filho era uma estaca que o pregaria ao chão e, mais que isso, pelas mãos de uma
mulher. É bom lembrar que ser morto por uma mulher era tão humilhante, que
muitos anos após a essa batalha, o perverso autodeclarado rei Abimeleque
preferiria ser morto por seu escudeiro de que a humilhação da morte decorrente
de uma mulher que lhe atira uma mó (pedra grande de formato circular),
quebrando-lhe o crânio (Juízes 8:54).
Em suma, dentre tantas outras, algumas
lições hoje nós retiramos dessa história:
1) - Quando
não somos homens corajosos, valorosos e tementes a Deus, a nossa honra é entregue
a outrem;
2) - Quando
confiamos em nossa própria força, habilidade ou na força de instrumentos,
cargos, pessoas ou qualquer outra coisa que nos cercam, podemos estar fadados a
uma derrota humilhante;
3) - A
confiança no que foi citado anteriormente normalmente esconde uma insegurança e
covardia tão profundas que, no tempo da adversidade, demonstrará o quanto você
é fraco de consciência, imaturo e frouxo;
4)
- Da
fraqueza Deus suscita a força e por isso usa duas mulheres, honrando-as para a
glória do Seu nome, que revelavam em seu caráter coragem, confiança no Senhor,
inteligência emocional, sabedoria, proatividade e vontade para fazer o que
precisava ser feito;
5) - Por
último, aprendemos a nunca duvidar do poder de Deus e de Sua providência e,
tampouco, de Sua Palavra, que permanece para todo o sempre.
Que essa história nos seja como aviso,
principalmente para nós homens, que vivemos em uma geração covarde, apática, passiva
e omissa. Que aprendamos com essas grandes mulheres as virtudes necessárias
para sermos vitoriosos no Senhor, honrando o Seu santo nome com o nosso serviço,
com nossa confiança e, sobretudo, com o nosso amor!
NEle, que é o Senhor dos Exércitos
celestiais, e que chama para si varões valorosos para os capacitar para a Sua
obra,
Jordanny.