segunda-feira, 23 de março de 2020

CONTÁGIO




CONTÁGIO

E, de repente, parece que o sol nos abandonou. Dias turvos; noites mais escuras, sem estrelas para nos orientar. À sombra, o medo parece se erguer como a ponta de uma longa lança, abrindo um vão entre aqueles que se posicionaram no fronte de batalha; o desespero sussurra, às portas, a canção da agonia, fazendo brotar a ansiedade onde antes habitava a quietude. Os flancos imbatíveis de uma sociedade forte, estruturada, avançada, abastada, rica, globalizada, parecem ter sido rompidos diante de um inimigo que atravessa fronteiras, infiltrando-se sorrateiramente no oculto. E, então, a semente da desconfiança lança suas raízes profundas, impedindo que abraços, beijos, toques sejam exercidos com a naturalidade que o afeto lhes propõe. Nossa solidez, nossas convicções, nosso chão parece ser arrancado de nós e, lançados à deriva, rumamos ao imprevisível, atacados por ondas bravias, sem visão do cais; sem um farol que nos guie.

Usamos o humor como artifício para aliviar nossa preocupação. Mas somos visitados por aquela sensação de que a dor se avizinha de cada um de nós. Assim, o nosso asilo vem como uma parábola para a própria existência: é na solidão, no isolamento que encontramos a saída para sobrevivermos. Há, porém, vida na solidão? É quando, de fato, compreendemos que a solidão e o isolamento são tantas vezes inevitáveis e necessários para que não contagiemos ninguém com a nossa patente maldade. Hoje, o que nos isola é um vírus pandêmico, assustador. Mas há outros vírus em nós, que não habitam as células de nosso corpo, mas que preferem se hospedar em nossa alma, fundindo-se com o DNA de nossa natureza ou, quem sabe, produzido pelo próprio DNA de nossa natureza. E esse vírus é infinitamente mais contagiante que qualquer outro: intoxica quem nos toca; adoece quem de nós se aproxima; furta o ar daqueles que tínhamos o dever de amar; mata aqueles que devíamos proteger. É o próprio terror que habita metafisicamente o nosso ser.

A maioria das pessoas lê a literalidade daquilo que foi profetizado por Isaías quando escreveuVerdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si...”, e acredita que a fé nos deixará inevitavelmente ilesos de qualquer chaga física, de qualquer doença que se assente em nossos corpos. Entretanto, o que não entendem é que Ele veio como a cura, o remédio, a transfusão de sangue que nos limpa, nos purifica, nos desintoxica de nós mesmos. Ele é aquEle que nos arrebata do isolamento, que nos liberta da quarentena e revoga de nós o afastamento como medida que, antes, nos valíamos para nos proteger e para proteger aos outros que estimamos. Ele nos contempla com saúde e vida que são contagiáveis para produzir mais vida. Então, nos envolvemos de afeto e nos permitimos aproximar, tocar, abraçar, cheirar, beijar. E os antigos decretos dos “nãos”; as “medidas provisórias” do afastamento; as “regras” do isolamento são revogadas, são derrubadas; e não mais nos submetemos ao jugo da “lei” que fora escrita sob a égide do vírus, sob o tempo do contágio irrefreado... Agora, somos submetidos à cura da Graça e somos postos em liberdade, posto que ele nos resgatou da “maldição da lei, fazendo-se maldição por nós” - fazendo-se o próprio vírus, para produzir a cura -, “porque está escrito: maldito aquele que for pendurado no madeiro”.

Agora podemos sair e novamente contemplar o sol além das nuvens. E nos orientamos nesse novo amanhecer por meio dEle, que é a resplandescente Estrela da Manhã, a anunciar o raiar do dia. E somos tocados pelo calor; e somos acariciados pelo afeto de Sua indizível Graça.

E Ele nos encheu de esperança para além dessa vida, conforme o poder que há em Seu amor, porque o “amor é mais forte que a morte”. E podemos caminhar por aí infectando tantos outros desse amor que cura, dessa paz que assusta, dessa liberdade que escandaliza, dessa vida que intimida...
O que mais desejo, é que você acesse essa cura, esse antídoto, e que saia por aí contagiando tantos outros com a Vida que inunda a vida de todo aquele crê!

NEle que é a cura que nos livra da morte, e a Vida que nos contagia,

Jordanny.

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