sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Adoecidos e Adormecidos - Parte 4




Capítulo 3 – Ser ou não ser? Eis a questão. Ter ou não ter? Eis a solução!

            Conheço pessoas que são tão desejosas de ter uma experiência pessoal e íntima com Deus e que, porém, não conseguem mesmo se esforçando. Iniciam projetos para a Sua obra e logo desanimam. Propõem-se em alianças, mas não se reavivam. Desesperam-se tentando deixar de lado algumas práticas pecaminosas, mas não são perseverantes. Chegam a pensar que Deus não lhes chamou, nem tampouco os escolheu para a vocação no evangelho. Por isso vivem de crises existenciais e não conseguem ser constantes em nada (Ef 4.14). São chorosas, deprimidas, murmuradoras, amoldadas ao modo de vida, ou ao contexto a que estão inseridas. Assistir a tudo isso, para mim, é muito doloroso. Mas posso afirmar que todas essas situações têm, normalmente, uma causa comum que, diagnosticada, pode ser tratada e curada. Que tal buscarmos compreendê-la?

Entendendo a relação que há entre SER e TER, na vida espiritual e natural.

            Parafraseando Raul Seixas podemos afirmar: O querer é o que move o homem. Se não há desejo, não há motivação; se não há vontade, não ação; se não há ação, não há realização. O problema é que o desejo humano se inclina naturalmente para o que é contrário à vontade de Deus (Rm 8.6,7). Assim propôs o profeta Jeremias:

Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e perverso; quem o conhecerá?”. (Jr 17.9) [Ênfase adicionada]

            Quando as Escrituras falam do coração, estão tratando dos desejos. O Mestre Jesus, no sermão da montanha nos advertiu:

“Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.” (Mt 6.21) [Ênfase adicionada]

            No coração é que se estabelecem os nossos maiores desejos; nossas mais desenfreadas paixões. Tudo aquilo que elevamos ao nosso coração alcança um patamar de importância vital, que tenta se expressar como alegria para nossa alma. O homem natural vive firmado naquilo que é palpável; em tudo que reflete alguma experiência sensorial. Já o homem espiritual se firma no que não é visível (2Co 4.17; Rm 1.17; Hb 11.1). Muitos creem que o homem natural vive num constante dualismo entre ser e ter, de modo que isso não caberia ao homem espiritual, visto que ele se importaria muito mais com o ser. Contudo, por incrível que possa parecer, todos nós, homens espiritual ou natural, somos inteiramente dependentes daquilo que nós temos. Essa é uma verdade bíblica pouco compreendida.

            Por isso, hoje eu queria te convidar a raciocinar comigo acerca dessa verdade, que foi anunciada pelo próprio Mestre Jesus. O nosso coração firma residência, justamente, onde se encontra o nosso tesouro – onde um estiver, aí, estará o outro. Podemos concordar facilmente que o tesouro não constitui a nossa essência; ou seja: o tesouro não é o que somos, mas é algo que temos de valor. Já o coração reflete a essência de nosso ser; ele é o que somos. Contudo, se existe um princípio incontestável que afirma que o meu coração está onde o meu tesouro está, posso afirmar que o que sou é, irremediavelmente, dependente do que tenho como valioso. O ser e o ter vivem uma fusão tão íntima que se tornam indissociáveis. Poder-se-ia afirmar que o ter não está acima do ser, nem o ser acima do ter. Nós, efetivamente, somos de acordo com o que temos de maior valor. Porém, o Espírito nos dá uma grande lição por meio de Paulo:
           
Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus, e não de nós. (2Co 4.7) [Ênfase adicionada]

            Conquanto possa se conceber que o ser, normalmente, não está acima do ter e nem o ter acima do ser, o versículo acima aponta para a grande diferença que há entre o homem natural e o homem espiritual. Entendemos que há uma fusão entre o ser e o ter, de sorte os dois são indissociáveis. Porém, no homem espiritual, o Ter se revela extremamente superior ao ser.

            Observe a forma que Paulo escreve: “Temos, porém, este tesouro”. O tesouro, que é a resplandecente Luz de Cristo (v. 6), é magnífica e infinitamente superior ao que somos: “vasos de barro”. Há efetivamente uma fusão entre o ser e o Ter. O ser, porém, não está, tão somente, alocado junto ao Ter: o está contendo. O Ter foi depositado dentro do ser. Tudo isso para que não haja em nós qualquer tipo de exaltação, uma vez que a excelência do poder que é inerente ao Tesouro que temos, não é nossa, mas de Deus. Em suma, a composição do homem espiritual pode se expressar em TER-ser-NELE e DELE.

            Em toda essa compreensão se revela uma grande chave para solucionar o problema da essência de nossa carência interior. Alguns, após lerem o capítulo 2 do presente artigo, poderão exclamar: “Eu bem que queria me distanciar de algumas amizades que não têm me edificado, mas não consigo; estou preso a elas; elas me são muito valiosas!”; ou mesmo: “Eu bem que queria me libertar de algumas coisas, mas não consigo!”. O fato é que você se tornou dependente de tudo isso que você tem por valioso; o teu ser é o recipiente disto. Mas a grande questão é: Você se sente realizado com tudo isso que tem valorizado? Se o seu coração está na ambição do sucesso e do dinheiro, uma vez que você alcance tudo isso, há realização? Há preenchimento interior? É claro que não! Todas essas coisas que tenhamos como valiosas, ainda que alcancem a estatura do nosso ser, não nos podem preencher, pois nosso espaço interior é muito maior do que o que somos ainda que somados ao que venhamos a ter fora de Cristo.

            Certa vez a banda Fruto Sagrado cantou: “O vazio no peito é do tamanho de Deus”. Essa é a grande realidade! Isso porque Deus, sendo infinitamente maior do que somos, é a proporção exata do que, efetivamente, desejamos Ter, ainda que não tenhamos consciência disso. Isso se poderia, facilmente, coadunar com o princípio ontológico da economia: “As necessidades são infinitas e os produtos escassos”. Qualquer possessão que esteja fora de Deus não suprirá a lacuna de nossos corações. Contudo, há um ponto particular onde o princípio básico econômico falha: Sendo Deus infinito em todos os seus atributos, não há que se falar em escassez para aqueles que O constituem como Sua maior possessão; Seu maior desejo. Assim, somente um Deus infinito em sua magnitude pode atender às nossas necessidades infinitas!

            Em síntese, temos uma necessidade natural de nos relacionar, de ter. Isso é um fato incontestável. Como dito anteriormente, há um desejo ardente, uma carência extraordinária que nos motiva, nos envolve e nos compele a buscarmos preencher o vão que há em nosso interior. Essa é a famigerada “procura da felicidade”. E nesse afã é que nos atolamos, mais e mais, em prazeres que atenuam, mas não solucionam o problema. Porém, como eu posso alcançar a plena alegria? A resposta você conhece, mas deve vivê-la!

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Aforismos e Poesias: Lúcidos devaneios - Parte 20




A ermo...

Como expressar o que sente
quando se constitui de um turbilhão de mudanças?
Não é confusão e, sim, incompreensão acerca de si mesmo.
Está fadado a não se entender?
Enquanto isso ela se aproxima,
chega bem perto e lhe abraça.
Que toque álgido
e que hálito árido e frígido e vago...
Num fosco olhar que lhe arrebata todo e qualquer brilho,
o gris lhe cerca e desvirtua o que lhe era incandescente.
Por te desejar longe te aproximas tanto
e de tanto não te querer és seu preferido.
Mas a vida é testemunha de que és
sua mais odiosa dileção.
Por que vens aqui hoje?
Já não fartaste a tua fome?
Devoraste-lhe até que nada
fez-se mais completo e cheio de signos...
E ainda vens? Que queres mais?
Já o amor se foi! Que mais lhe oferece?
Nem mesmo a inexistência lhe é qualificação devida:
Já não a tem e ainda não a é.
Mas sabe que é justamente o que não sabe...
E ainda voltas? Admiras a vacuidade de seu inexistir ser?
Sim, a vida é testemunha de que és
sua mais odiosa dileção.
Até quando a tua doce companhia
amargará seu viver?
Não vês que odeia te amar
porquanto fazes bem ao seu mal?
Tua presença lhe repele
e tua distância lhe atrai.
És luz enegrecida que lhe aquece enquanto esfria.
És fôrma inconforme;
És também balé estático
ao compasso da arritmia que ordena o coração...
És o caos organizado e és o vidro inquebrável.
És diamante flexível?
És o daltônico colorido e és o surdo alarido.
És prazer dolorido e és mesmo sem ser.
És insignificante signo e és o resultado insolúvel?
És limite indefinido e és, da constância, a curva.
Ó, como a vida é testemunha de que és
sua mais odiosa dileção.

Jordanny Silva